CAPÍTULO VIII

Ao receber a mensagem ela ficou estática, sem saber o que fazer. O medo tomou conta dela e ficou muito confusa. Temia enviar uma mensagem pelo celular e algo dar errado, afinal, não sabia o que estava acontecendo na casa e temia também em chamar a polícia pois não sabia qual seria a reação dos policiais diante de uma denúncia daquele tipo.
Encarnacion pensou: "Será que acreditarão em mim e mandarão averiguar? Ou será que acharão que é um trote? E se forem até lá e não encontrarem prova de crime nenhum? Bem, de qualquer maneira a denúncia será anônima e se Jorge me pediu é porque a coisa é séria. Vou ligar para a polícia". 

-Alô, polícia militar, boa noite.

-Oi, eu quero fazer uma denúncia.

-Pois não, de que se trata?

-Olha, tem algo suspeito acontecendo numa casa no Jardim América.

-Que tipo de suspeita a senhora tem?

-Tem um monte de homens lá e parece que estão tramando um crime.

-E como a senhora sabe que estão tramando um crime?
-É difícil explicar, mas é verdade.

-Senhora, para atender a solicitação precisamos de algo concreto.

-É, eu sabia que não iriam acreditar, mas amanhã vão ver nos noticiários.

-Senhora, isso é sério?

-Sim, é. Mas infelizmente se não acreditam eu não posso fazer nada, mas temo pela vida de alguém.

-Qual o endereço?

-Avenida Brasil, 800.

Após um breve silêncio...

-A senhora disse Avenida Brasil, 800?

-Isso mesmo.

-Ok senhora, iremos averiguar agora mesmo.


Assim que desligou o telefone, Encarnacion pegou seu carro e dirigiu-se até próximo do local para ver se a polícia realmente iria lá. Ela estacionou seu carro na mesma quadra, do outro lado da rua em frente a uma padaria e ficou ali. De repente ouviu sirenes e um grande movimento de carros de polícia. Enquanto isso, lá dentro sem saber o que estava acontecendo, Jorge ouvia os gritos e as súplicas do condenado à morte Pablo. Resolveu dar uma espiada na escada e pôde constarar que havia um homem segurando uma grande injeção enquanto Pablo era amarrado a uma cadeira. Nesse momento Pablo, que estava de frente para a escada arregalou os olhos ao ver a sombra de Jorge na parede. Isso chamou a atenção dos seus algozes e no que olharam, viram-no. Este, quando percebeu que fora descoberto, correu para um dos quartos e fechou a porta, mas não havia nenhuma chave e alguns homens conseguiram abri-la e encurralaram-no. Havia fúria no olhar daqueles homens, a situação de Jorge era péssima, havia sido descoberto e isso era a única coisa que não poderia acontecer. Na sua cabeça passavam inúmeros pensamentos naquele instante, mas o que mais o afligia era o medo de juntar-se a Pablo e ter o mesmo destino que ele e o marido de Encarnacion. Eles o pegaram e amarram-no também a uma cadeira, amordaçado. Pablo, que conhecia aquele homem dono da banca de jornal na qual ele comprava suas publicações diariamente, estava estarrecido, espantado com o que via. Jamais imaginara que aquele pacato jornaleiro pudesse estar envolvido com algo daquele tipo. Agora estavam ali, o jornaleiro e seu freguês frente a frente, por motivos totalmente diferentes mas com o mesmo destino, a iminente morte por envenenamento. Um não entendia o motivo da morte do outro, mas o fato era que, ao que tudo indicava, teriam o mesmo trágico fim, nas mesmas circunstâncias e no mesmo momento. Trouxeram outra injeção e quando o homem que iria executar a sentença dos dois infelizes preprarava-se para aplicar a injeção no peruano, uma sirene e gritos de “polícia” na porta da casa. A esta altura Jorge já estava molhado de suor, imaginando que em poucos minutos estaria morto. Os homens estavam armados e começaram a atirar contra os policiais. Lá fora Encarnacion ouvia os tiros e temia pela vida de Jorge. A ação da polícia foi rápida mas um policial se feriu no tiroteio. De repente invadiram o local disparando vários tiros dois homens foram mortos naquela sala. A notícia se espalhou pela rua e do outro lado Encarnacion estava muito aflita. Em poucos minutos já havia uma multidão lá fora para ver a ação da polícia. O tumulto em frente à padaria foi inevitável. Encarnacion desceu de seu carro para ver melhor o que acontecia. Ninguém saía da casa e isso a deixou  nervosa, precisava saber o que estava se passando com Jorge. Ficou muito aflita e percebeu naquele momento que se preocupava muito com ele, além do que imaginava e sentia um aperto no coração só de pensar que algo de ruim pudesse ter-lhe acontecido, quem sabe, antes de a polícia chegar ou até no tiroteio. A angústia tomou conta dela, até que começou a perceber um movimento diferente na casa. A polícia começou a sair com homens de terno cinza enfileirados, algemados e sendo conduzidos para os camburões. Mas ela não via Jorge e isso a preocupava. Pensou que ele poderia estar escondido lá, não querendo envolver-se, deixando que a polícia tomasse conta do caso. Mas logo em seguida viu dois corpos sendo carregados para dentro de uma ambulância que havia sido pedida pela polícia. Ela estremeceu. De repente viu Jorge saindo na companhia de um policial. Ele não estava algemado, nem tampouco o outro homem ao seu lado. Mas todos entraram nos carros de polícia e se foram. Ela, por sua vez não podia fazer mais nada e foi para casa, sentindo um certo alívio por ver que Jorge estava bem, mas apreensiva por não saber nada do que havia acontecido dentro daquela casa naquela noite.
Na delegacia Jorge aguardava para contar ao delegado tudo o que havia presenciado. Enquanto isso ficou ao lado de Pablo, que estava calado e visivelmente assustado. Jorge olhava para ele e ficava imagianando o que ele teria feito para merecer a sentença de morte, que tipo de traição teria cometido para uma pena tão cruel, e afinal, que diabos de organização era aquela que simplesmente matava pessoas? Ao que ele pôde entender, Pablo era uma vítima naquele episódio mas estava diretamente envolvido no episódio da morte de Ernesto, marido de Encarnacion, então, não era digno de pena. O delegado chamou Jorge para a sala e pediu explicações. Jorge foi minucioso e contou tudo ao delegado, desde as primeiras conversas que ouvira sobre a confraria até as suspeitas sobre a morte de Ernesto, que acabaram se confirmando na casa. O delegado ouviu atentamente e achou a atitude de Jorge muito corajosa, pois afinal tudo indicava tratar-se de uma quadrilha internacional, a polícia só não sabia ainda do que se tratava e era exatamente isso que iriam investigar à partir daquele momento. Parecia coisa de cinema, mas era real. Jorge estava pasmo, quando começou a interessar-se pelo caso não imaginou os rumos e as proporções que aquilo tomaria. Mas estava muito cansado e precisava se recompor, tudo o que queria agora era um bom banho quente e uma cama macia, pois já eram quase cinco horas da manhã. O delegado mandou levarem-no para casa mas com o compromisso de já naquela tarde  retornar à delegacia para dar um depoimento oficial.