CAPÍTULO I

Jorge era um homem tranquilo vivendo uma vida pacata na agitada cidade de São Paulo, a maior metrópole brasileira. Uma vida sem sobressaltos, seus movimentos eram sempre calculados e o único compromisso que tinha era com o seu trabalho na pequena banca de jornais de sua propriedade, numa praça não muito movimentada num bairro próximo do centro financeiro da cidade, onde chegava diariamente às seis horas da manhã e saía às oito da noite, menos aos domingos quando fechava por volta do meio-dia. Fazia as refeições ali mesmo, sentado atrás do pequeno balcão. Sua banca era um cubículo onde ele circulava apertado em meio a revistas, jornais e guloseimas.
Homem de meia-idade, boa aparência, de poucas palavras e sem amigos, mas era atencioso com seus clientes, na maioria moradores de casas e apartamentos próximos da praça que sempre vinham comprar revistas e jornais, além das crianças que viviam brincando ao redor da banca e consumindo guloseimas. Diariamente sua rotina era a mesma. Saía de casa, um quarto e sala de fundos que alugava num bairro não muito distante do seu local de trabalho, ia caminhando e levava cerca de meia hora para chegar. Andava sempre pelo mesmo caminho, encontrava as mesmas pessoas, conversava os mesmos assuntos e voltava para sua casa solitária. Além dele, os outros seres vivos que habitavam o ambiente eram algumas baratas e dois camundongos que andavam por ali arrastando os restos de comida que ele deixava na pia. Mas Jorge não se sentia só, era um homem de leitura, sua estante era repleta de livros que eram seus companheiros de noite. Porém sua vida daria uma guinada total à partir de um encontro com um homem misterioso.
Certo dia apareceu na banca à procura de literaturas em língua hispânica, um homem baixo e com aspecto andino, vestido num terno bem cortado cinza-escuro, camisa preta, gravata cinza-claro com um broche dourado afixado nela e sapatos finos bem lustrados. O homem mudara-se recentemente para um apartamento de um dos condomínios em frente à praça. Comprou também um jornal de grande circulação e a Gazeta do Amazonas. Passou a frequentar a banca diariamente mas nunca  trocava mais do que um bom dia com Jorge. Este por sua vez procurava ser amável e respondia com um “buenos dias”, pois vira que o homem falava castelhano. Jorge notara que o homem sempre abria a Gazeta do Amazonas imediatamente no caderno policial, mas nunca dera muita importância. Um dia, logo cedo, aquele homem veio à banca com outro em sua companhia,  igualmente bem trajado e os dois conversavam em castelhano num tom de voz muito baixo, quase em sussurros. Eles falavam rápido demais e Jorge não conseguia entender o que diziam, mas percebeu que falavam algo sério e ouviu a palavra "cofradía". Jorge, que era um amante das letras ficou intrigado com o pouco que ouviu. Mais tarde, em casa, pegou um dicionário espanhol-portugês e procurou a tradução da palavra "cofradía" e viu tratar-se de "confraria". Imediatamente apanhou o dicionário da língua portuguesa e encontrou o seguinte: "confraria: irmandade, sociedade de pessoas com o mesmo modo de vida". A curiosidade de Jorge fora aguçada. Aquele era um assunto que merecia atenção, pensou ele. 
À partir daquele dia, os dois passavam em sua banca diariamente. Jorge procurava ficar atento ao que eles conversavam para ver se entendia alguma coisa, mas era sempre da mesma maneira, falavam baixo e rápido demais e ele compreendia umas poucas palavras esparsas, mas a palavra "cofradía" geralmente estava presente nas conversas.